As entrevistas no Programa do Jô


Que pena! Eu perdi o programa do Jô Soares no dia 29 de agosto de 2002, no qual foram entrevistados dois "especialistas" em desmascarar grandes fraudes científicas. O primeiro, professor, diz que a NASA tapeou o mundo todo porque não enviou astronautas à Lua. O segundo, jornaleiro, diz que os astrônomos são maus observadores e estão equivocados, porque os planetas não giram ao redor do Sol.

A equipe de produção do Programa do Jô cumpre bem o seu papel de selecionar entrevistas curiosas, interessantes, polêmicas e, neste caso, humorísticas, mas eu acho que nós, astrônomos profissionais ou amadores, que lidamos diariamente com a observação do céu e que sempre acompanhamos com atenção as missões espaciais, não podemos deixar de dar uma resposta a esse tipo de brincadeira, porque muita gente boa anda acreditando nas tais "provas" de farsas e nas teorias de conspirações. O resultado disso é percebido nas dezenas de palestras que faço anualmente nas escolas, pois já tive de lidar com várias crianças que têm a TV como uma referência para a verdade absoluta. Para elas, se eu afirmar qualquer coisa em oposição ao que foi visto na telinha, é porque estou errado.

A TV brasileira conhece muito bem a extensão de seu poder de transformar o País. Por isso, seria bom que ela o fizesse para melhor. Não é o caso de deixar de apresentar entrevistas como essas, até divertidas, mas de mostrar com mais freqüência o trabalho sério dos cientistas, como ele é difícil e como exige extrema dedicação, para evitar que pessoas leigas ou muito jovens acabem pensando que os pesquisadores apenas emitem a sua opinião pessoal sobre algum fenômeno, sem mais nem menos, dando o direito a qualquer um de fazer o mesmo. É preciso mostrar que os cientistas são humanos, também erram e não sabem tudo, mas são inteligentes, estudam muito, baseiam-se na lógica e utilizam critérios rigorosos numa busca incessante pela verdade, a qual costuma estar profundamente oculta. Dessa forma, as pessoas comuns do povo vão passar a compreender melhor a Ciência e a respeitar mais o trabalho daqueles que dedicam sua vida a ela, por profissão ou paixão.

Já escrevi demais sobre esses dois casos da entrevista aqui mesmo no meu site, com muita antecedência, por coincidência ou premonição, mas não custa mostrar esta foto para acabar de vez com aquela conversa fiada das sombras que tinham que ser paralelas e de mesmo tamanho. Ela mostra bem o grau de seriedade das "provas" contra a NASA. Quanto ao Davino, com quem já tive a oportunidade de conversar pelo correio eletrônico, minha sugestão é para que pegue algumas revistas, talvez de sua própria banca, como a Sky & Telescope e a Astronomy, e comece a ler com atenção. Quem sabe se elas não o farão despertar para o Universo real, maravilhoso, tão precisamente descrito em seus movimentos pelos cientistas?

Para o Programa do Jô, deixo aqui a minha sugestão: convidar algum sócio brasileiro da International Flat Earth Research Society (precisa traduzir?). O nível da entrevista seria o mesmo daquelas duas do dia 29, mas tenho a certeza de que esta provocaria mais gargalhadas na platéia e nos telespectadores, com uma enorme vantagem: nem mesmo as crianças iriam acreditar no entrevistado.


Roberto F. Silvestre
4 de setembro de 2002



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