Tempos muito difíceis


A longevidade de nossa civilização na Terra já foi estudada com cuidado há décadas. O resultado da pesquisa pode nos dar uma idéia de quanto tempo podemos esperar existir como espécie no Planeta.

Considere uma folha de papel comum, com cerca de 0,1 milímetro de espessura. Corte-a em dois pedaços iguais e coloque-os um sobre o outro. Repita o procedimento, cortando novamente e empilhando os quatro pedaços. Mais uma vez e teremos oito pedaços que formam uma pilha com menos de 1 milímetro de altura. Imagine que você possa continuar assim até completar um total de 100 cortes. Qual você supõe ser a altura da pilha ao final dessa operação imaginária? A resposta é: dez bilhões de anos-luz, o equivalente a cerca de 70% da distância que nos separa do limite do Universo observável.

Quando se dobra um valor a cada passo temos um exemplo de progressão geométrica, que de início cresce devagar, mas subitamente parece explodir com um aumento descomunal. Um outro exemplo de crescimento geométrico é o da população mundial, que aumentando 2% ao ano, dobra a cada 35 anos.

Ao estimar um limite para o número de pessoas na Terra temos que aceitar o fato incontestável de que somos feitos de matéria e que esta é subtraída do planeta para a construção de nossos corpos. Somos formados principalmente de água, e, portanto, ela é retirada cada vez mais da crosta terrestre com o aumento da população. Por mais absurdo que possa parecer, o crescimento populacional atual faria transformar toda a água dos oceanos em pessoas em apenas 1200 anos, sem restar uma única gota para beber, tomar banho ou pescar.

Na mesma taxa de crescimento, em 1600 anos o peso da humanidade seria igual ao da Terra, e em 2300 anos, igual ao do Sistema Solar. Se nos abstraíssemos da conservação da matéria, imaginando que fosse possível construir corpos a partir do nada, em 5300 anos seríamos uma grande esfera de pessoas amontoadas, com um diâmetro de 300 anos-luz, se expandindo com a velocidade da luz.

É tolo quem pensa que nosso irresponsável modo de vida pode continuar por muito mais tempo. Seus tristes resultados já começam a dar sinais em todas as partes do mundo, na forma de uma perda acentuada da qualidade de vida, da destruição rápida do meio ambiente, da miséria total, da fome, da desvalorização do ser humano, do suicídio, das drogas, do ódio, da violência e da insensibilidade. Muitos dos responsáveis pela perpetuação do atual sistema conhecem o problema, mas procedem como se ele não existisse, para garantir o seu lucro.

Não podemos mais permitir que os lobos em pele de cordeiro continuem a sua depredação tão aplaudida. Eles ganham com a morte, devastam sem escrúpulos, iludem convincentemente, nos fazem acreditar que o ruim é bom e que o errado é certo, desprezam o verdadeiro valor do ser humano e controlam o que devemos saber. Querem cada vez mais, sem limites, às custas da miséria de muitos. Eles estão por toda parte, insensíveis aos problemas da maioria silenciosa que colhe os amargos frutos de sua insensatez. Fazem tudo apenas em benefício deles mesmos, enquanto o legado de seu egoísmo será a devastação total.

Há muito que ultrapassamos o limite. Precisamos resgatar o bom senso perdido e começar a pensar maior, para além de nosso tempo de vida. As futuras gerações não nos perdoarão por termos transformado em um inferno insuportável um planeta que ainda pode ser um verdadeiro paraíso e que é único no Sistema Solar.


Roberto F. Silvestre
Jornal Correio - 08/10/1997



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